terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Adeus, Prefeitura

Dia 24 de janeiro de 2008 entrará para o meu calendário oficial como o meu último dia de trabalho na prefeitura de São Paulo. Um dia que só é importante, para muitos, por ser a véspera do aniversário do município, mas que se torna importantíssimo para mim, por anteceder o primeiro de uma nova fase em minha vida. Depois de quinze anos de poder público, e mais vinte de mercado publicitário e artes visuais, chegou a hora de me dedicar à Cultura da Índia – essa gigantesca herança que a Humanidade ainda não soube aproveitar.

Às vezes duvido de que não vou me envolver com outras atividades, mas estou determinado a concentrar meu foco nessa preciosidade, pelas duas áreas que melhor conheço: a língua sânscrita e o Yoga. O que até hoje foi minha atividade paralela vai finalmente assumir o papel principal no roteiro da minha vida.

Vou pedir proteção ao Senhor dos Dançarinos, o poderoso Shiva, que certamente não me deixará desamparado. Posso afirmar isso com segurança e sem qualquer conotação religiosa porque segundo essa tradição mais do que milenar, Shiva é o “eu” que reside dentro do coração de cada um de nós. Ele é o ator principal, e também o único espectador nesse teatro onde atuo, desde quando nasci. Palmas para ele, então, pois a partir de agora ele também foi promovido a diretor e produtor executivo de minhas maluquices.

Não sei se o prefeito vai sentir a minha falta. A briga que se armou entre ele (Gilberto Kassab) e o outro (Geraldo Alckmin), já começou a fazer barulho grande. Tanto melhor para mim, que saio “à francesa” desse palco que está virando ringue. Enquanto o PSDB e o Demo se desentendem, eu caio fora, para dentro de mim mesmo.

Resta dizer adeus aos documentos de fé pública, e dar as boas vindas às boas práticas de minha fé particular. Acredito demais naquilo que nos chega pela voz de nossos ancestrais e estou convencido de que eles ainda estão aí para ouvir a nossa voz, quando falamos a linguagem dos mitos.

Então, anote aí e não se esqueça. Minhas novas aventuras vão ao ar a partir do dia 25, em qualquer horário, em todos os meus canais.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Desunião e Yoga



"Yoga é união". Este é um clichê interessante, que ainda hoje continua a ser repetido por praticantes ou teóricos dessa arte. A palavra "yoga", na verdade, não significa "união", mas ainda assim a tradução é aceitavel, se a intenção for boa. No universo profissional do Yoga, no entanto, "união" é um termo que tem andado meio fora de moda.
Há algumas décadas, quando conheci o Yoga, poucos eram os instrutores dessa prática. Pouca, também, a informação disponível sobre o assunto. Essa era de fato a maior dificuldade, trinta e cinco anos atrás: obter informações - quaisquer que fossem elas. Era incrível como os aficionados do Yoga ficavam felizes com uma simples matéria que saísse na revista "Fatos & Fotos" ou na popular "Manchete", tomando esse material como referência de reconhecimento para suas crenças pessoais. Nos anos sessenta, vez por outra saia uma "reportagem" fotográfica sobre praticantes de Yoga, cheia de fotos mostrando posturas exóticas e pessoas com expressão de êxtase místico. Me lembro de uma dessas matérias, com fotos tomadas em um parque (talvez a Floresta da Tijuca) no Rio de Janeiro. Foi o maior sucesso, pelo que posso recordar.

Era uma época de muita ingenuidade, aquela. E olha que não faz tanto tempo assim. Entre os anos 50 e 70, qualquer um que conseguisse manter uma conversação coerente por mais de vinte minutos sobre algum assunto - inclusive o Yoga - poderia se tornar referência para o tema. Talvez você conheça algum figurão daquela época que se enquadre nesse perfil. E era possível dizer o que bem se quisesse, pois dificilmente haveria alguém para contestar suas opiniões, tal a dificuldade de acesso ao conhecimento.

As dificuldades eram muitas. Meu primeiro dicionário de Sânscrito, uma publicação da fantástica editora indiana "Motilal Banarsidass" foi conseguido a duras penas depois de muita troca de correspondência (pelo correio tradicional, em papel) e uma ordem de pagamento internacional carregada de burocracia. Depois disso, ainda esperei mais de seis meses até que o pacote com meu livro atravessasse o Saara no lombo de um camelo e fosse despachado em navio a partir do Marrocos. Um ano inteiro se passou entre o momento da decisão e a chegada do livro em minha casa. E isso foi há apenas trinta e poucos anos.

Hoje ninguém mais poderia reclamar que o acesso à informação é difícil. Uns poucos cliques de mouse unem rapidamente qualquer cybercidadão às respostas de que necessite. Uma consulta bem orientada no "Google" responde a qualquer dúvida que o internauta possa levantar. E ele ainda pode comprar qualquer livro pela Internet, e recebê-lo em sua casa em poucos dias, na pior das hipóteses.

Esse quadro sugere que seria bastante natural que hoje não houvessem mais disputas de opinião, como aquelas de antigamente, quando o desafio era conseguir provar que estava certo, ou que seu oponente estava errado. Teoricamente deveríamos estar todos compartilhando as mesmas preciosas informações sobre os temas de nosso interesse, e jamais seríamos afetados por conflitos de idéias.

Infelizmente não é assim que a coisa funciona. A informação às vezes parece uma lente de aumento, pronta para ampliar as minúcias de nossa diversidade. Onde poderia haver consenso, surge conflito. Onde poderia haver união, discórdia. Essa é a armadilha que ronda os atuais simpatizantes do Yoga, pronta para inspirar desentendimentos verossímeis e intelectualmente bem articulados. Aos yoguinas desta hora está sobrando informação, vocabulário e teoria, mas às vezes falta o bom senso básico dessa doutrina. E o perigo espreita muito de perto uma minoria, que anda miseravelmente pobre de inteligência.

Então vamos ficar despertos. Ainda há muitas tentativas de alimentar discórdia entre os instrutores e praticantes do Yoga. Mas se disseminarmos um pouco de vigilância e boa vontade por aí, certamente há uma boa chance de encontrarmos a Paz nesse "front".

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Sem Reservas...

Começar um blog, pela primeira vez, causa um desacerto nas idéias. É algo como chegar "de mala e cuia" àquele hotel de sonhos, do outro lado do mundo, e descobrir que não foram feitas as suas reservas. Ficar ali, diante do enigmático gerente que sorri enquanto lhe dá a má notícia é como ficar diante do espaço sorridente do blog, que aguarda de mim a decisão sobre o que fazer com um assunto que de maneira alguma o afeta - porque, afinal, as reservas não foram feitas.

Em Rishikesh, diante de uma situação como essa, consultei meu operador de turismo local, o Mahesh, que respondeu com uma simplicidade digna dos grandes mestres: "relax and adjust".

Ajustar-se à situação é tudo o que o viajante não deseja fazer. O turista padrão viaja para tentar encontrar alhures o suporte para seus próprios hábitos, em versão exótica. Ele adora ser surpreendido, desde que dentro dos limites de sua expectativa. Afinal de contas, quem paga uma viagem para longe, paga para ter aquilo que deseja, ainda que seja algo imprevisível. Tudo deve se ajustar ao viajante, que naturalmente prefere não se ajustar a coisa alguma.

Mas o Mahesh está absolutamente certo. O que estraga a vida da gente é essa mania de ficar planejando até mesmo o tamanho do susto. Acomodar-se ao previsível é o mesmo que escrever poesia com base na gramática. Ajustar-se ao inesperado é quase um método compacto de atingir a iluminação. Não estou exagerando, não. Minha experiência ensinou que as melhores oportunidades surgem inesperadamente, e que as mais importantes decisões que tomamos são as que surgem diante de acontecimentos que jamais havíamos previsto - são elas que realmente mudam o rumo de nossas vidas.

É por isso que costumo aconselhar meus amigos a estar preparados para as oportunidades inesperadas. Elas são as portas que se abrem para os melhores futuros momentos de nossas vidas. E a maior parte de nós fica apenas olhando irritado para a cara do gerente, sem saber se briga com ele ou se agarra o operador de turismo pelo colarinho.

Pois é. Eu quero meus futuros melhores momentos assegurados em minha vida. Não abro mão disso. Então eu sigo o conselho do Mahesh e me ajusto. Sempre.

Por isso eu inaugurei este blog do "Sânscrito bem temperado". Simplesmente porque jamais me imaginei escrevendo um blog. E também porque adoro Sânscrito - escrito, falado, e bem temperado, é claro.